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Violência doméstica afeta 1 milhão
de mulheres por ano

Por André Xavier

Laura Borba

Excesso de bebida alcoólica, ciúme doentio, não aceitação da separação. Esses são apenas três dentre os inúmeros fatores que causam a morte, tortura e violência contra as mulheres todos os dias no Brasil.  Ao viajar pela linha do tempo que compõe a história do país, percebe-se que a inferioridade do sexo feminino e os casos de abuso diante de uma sociedade em essência patriarcal, não tem origem datada nos dias atuais. Muito pelo contrário. Durante todos esses anos, o papel da mulher na sociedade foi construído de forma lenta. E mesmo com 10 anos da Lei Maria da Penha, que visa a combater esses casos, ainda frequentes, segundo o Ministério Público, muitas vítimas ainda tem medo de denunciar o companheiro ou o agressor que conviva com a mulher.  


Sancionada em 2006 pelo ex presidente da República Luís Inácio Lula da Silva, a Lei Maria da Penha assegurou que qualquer mulher, independente de gênero, raça ou classe tem direito a gozar de valores fundamentais à pessoa humana. Com o nome inspirado em uma entre milhares de vítimas, segundo a Organização Das Nações Unidas (ONU), a lei é uma das medidas protetivas mais eficazes em todo o mundo no combate a violência contra mulher. Maria da Penha foi torturada pelo marido duas vezes na casa onde moravam. Na primeira, ele simulou um assalto e na segunda, tentou eletrocutá-la durante o banho. 


A lei é bastante conhecida pelos brasileiros, apenas 2% da população a desconhece. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a cada ano mais de 1 milhão de mulheres são vítimas de violência doméstica, mas cerca de 150 mil casos são apurados pelo Ministério público. A Coordenadora do núcleo de defesa da mulher e da vítima de violência de gênero, Arlanza Rebello ressalta que trabalhou antes da lei e depois, e pode perceber que as diferenças ainda são sensíveis. 


-  A partir da Lei Maria da Penha, passamos a ter elementos de enfrentamento da violência e elementos de defesa da mulher, ainda que a gente saiba que a lei não está sendo aplicada na sua plenitude, que tem dificuldades, que temos críticas, ela nos deu concretamente defesas para essa mulher: as medidas protetivas, que são várias, a possibilidade de prisão diante de um descumprimento da medida protetiva, etc – diz Arlanza.


A lei Maria da Penha é uma medida protetiva de gênero, por isso a vítima tem que necessariamente ser do sexo feminino. Ela atende mulheres heterossexuais e homossexuais, além de transexuais.  Como os casos de violência física são os mais frequentes, vale lembrar que a lei se aplica também para violência verbal, violência patrimonial e a violência sexual. É importante que a vítima faça a denúncia na delegacia da mulher mais próxima. 

Agressão em casa  

Mulheres a partir de 18 anos em diante podem ser atendidas pela Lei. O agressor pode ser alguém do convívio da vítima, como o marido, namorado, cunhado, tio ou até mesmo uma outra mulher. A estudante de jornalismo da PUC-Rio Larissa Oliveira, de 20 anos, nunca imaginou que uma briga familiar poderia deixar marcas inimagináveis. No início desse ano, Larissa foi agredida pelo tio após uma discussão em casa. A jovem postou em uma rede social fotos das sequelas e relatou como foi a agressão. O caso teve repercussão e ganhou destaque no jornal “Extra”. Segundo ela, foi feito um boletim de ocorrência e o processo foi iniciado, mas como é demorado, ela ainda está sem respostas. Larissa ressalta também que muitos familiares pediram que ela esquecesse o processo contra o tio.

- Eu sempre tive a certeza de que a culpa não era minha, eu sempre encorajei mulheres a denunciar porque acredito que a culpa jamais possa ser atribuída a vítima. Mas em diversos momentos em que eu me vi encurrala, com familiares pedindo para abrir mão do processo. Já se passaram 11 meses e meu agressor vive uma vida tranquila feliz enquanto eu estou traumatizada e com graves sequelas emocionais do que isso me causou- afirma Larissa.

Formas de pedir ajuda

No Brasil, mesmo com a Lei, os números ainda são alarmantes. Segundo estatísticas divulgadas pelo Ministério da Saúde, que registra os atendimentos na rede do Sus, em maio deste ano revelou que no país cerca de 405 mulheres são agredidas por dia. Todas as mulheres que sofrerem qualquer tipo de agressão, podem procurar uma das casas de acolhida às mulheres, como a Casa de Abrigo Lar da Mulher, no bairro de Laranjeiras, zona sul do Rio de Janeiro. A vítima deve procurar ajuda para que a assistência possa ser dada corretamente e esses casos sejam diminuídos no país.

 

Mulheres em busca de justiça

Maria da Penha

 

A farmacêutica cearense que deu origem a Lei passou anos em busca de justiça pelo seu agressor. O agressor era o ex marido de Maria da Penha e pai das três filhas.  O marido era colombiano e quando a segunda filha do casal nasceu, o comportamento de Marcos Viveros mudou completamente. Em 1983, ele simulou um assalto e deu um tiro de espingarda enquanto ela dormia. Nos inúmeros depoimentos que deu para a imprensa, Maria da Penha relatou que durante anos acredito que aquele de fato se tratava de um assalto e só após a separação deles, ela percebeu que fora planejado. Maria da Penha ficou paraplégica após o fato. E não parou para aí, Maria da Penha relatou que a situação se agravou quando ele tentou a eletrocutar durante um banho na casa onde moravam. 

Maria da Penha conseguiu sair de casa sem que perdesse a guarda das filhas após as investigações do caso. Ela iniciou uma batalha para a condenação do ex marido que só ocorreria em 1991. Viveros conseguiu liberdade e Maria da Penha relatou o caso através do livro “ sobrevivi...posso contar” (1994).  Por meio do livro ela conseguiu visibilidade da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) que acusou o governo federal do Brasil de negligente do caso. Viveros foi preso somente em 2001 e cumpriu apenas 1/3 da pena que fora condenado.

Maria da Penha levou o nome da Lei de proteção a mulher não à toa, a persistência e a sede por justiça a guiaram esses anos todos, por mais que as leis do país não tivessem dado o auxílio necessário.  A história de Maria da Penha será retratada em um filme, que ainda não tem data de lançamento.

Ana Luiza Monteiro 

Ana Luiza Monteiro é estudante universitária de 24 anos e mora no Rio de Janeiro. Ela namorou durante anos com um jovem e depois de um tempo de relacionamento as brigas ficaram constantes, devido ao ciúme doentio dele. Ele a agrediu algumas vezes e acabou sendo preso.

“Começou quando nossa relação já estava bem desgastada, muito ciúmes e brigas dos dois lados, e ele tinha voltado a morar na mesma cidade que eu a pouco tempo, então não estávamos tão acostumados com frequência que estávamos ficando juntos, eu me adaptei rápido, porque amava ele demais, então tudo que eu queria era ele do meu lado o tempo todo, e isso não deu certo... ele começou com uns empurrões, pegadas mais fortes nos braços, depois passou pra uns beliscões, até o dia que ele perdeu a cabeça.  Quando aconteceu eu fiquei em choque, não queria acreditar, não queria contar para ninguém mesmo sabendo que ele tinha feito aquilo na frente da minha melhor amiga na época e da irmã dele, eu não tinha saída mais mesmo assim queria fazer de tudo para não deixar minha amiga ligar para meus pais e avisar do que tinha acontecido. Ele acabou sendo preso, mas eu voltei para ele.”

Larissa Oliveira

 

A jovem estudante foi agredida pelo Tio em uma discussão familiar com o Tio em janeiro de 2016. Ela entrou com um processo contra, mas ainda sem respostas.

“Ele sempre foi uma pessoa infeliz e problemática e eu não devo botar a culpa nos meus avós por isso, já que de 3 filhos ele foi o único que veio com uma personalidade ruim. Além disso ele tem um histórico de agressão, já espancou muitas mulheres. É um homem violento, agressivo e que não aceita ouvir não. Muito interesseiro também, o fato das pessoas serem melhores que ele era insuportável para ele, então ele tentava sempre se aproveitar ao máximo de todas as situações. Eu acredito que isso se aplica muito no machismo, ele não é um caso isolado, mas é um caso extremo. É um homem que acredita que a mulher está abaixo dele então ele pode e deve fazer o que quiser com ela”

Antônia Barbosa

Antônia é cozinheira e moradora da Rocinha. Ela conta que viveu durante anos com o ex marido, já falecido. Por conta de um vício, eles discutiram frequentemente e ele não só a agredia verbalmente, como fisicamente. No passado, ela não chegou a denunciar, mas

“Eu fui casada durante anos com o meu marido que faleceu a pouco tempo. Todos esses anos que vivi com ele, também tive que conviver com o alcoolismo. Ele chegava em casa transtornado e acabava me agredindo. Pedi ajuda e ameacei denunciar ele para polícia. Ele procurou ajuda e tudo melhorou. Conseguimos viver bem depois. As marcas ficam, mas eu perdoei”.

Luiza Brunet 

 

Em julho deste ano, a atriz Luiza Brunet de 54 anos divulgou uma nota na qual relatou ter sofrido agressão do ex companheiro e empresário Lírio Albino Parisotto, de 62 anos.  Ela disse que teve as costelas quebradas após uma briga com ele em Nova York, em Maio.De acordo com o Ministério Público de São Paulo, o marido de Luiza ficou proibido de estar perto da mulher. De acordo com a assessoria da atriz, o marido dela responderá por crime de acordo com a Lei Maria Da Penha.

De acordo com informações do Jornal Nacional, em nota, a atriz disse: "Dei publicidade ao caso para que outras mulheres vítimas de violência tomerm coragem e não se calem. Afirmo que não agredi ninguém e fui vítima de uma agressão covarde. A verdade prevalecerá"

Jandira

  

“A primeira vez ele me machucou porque eu não limpei a minha filha. Ele fazia isso várias vezes, e ficava cada vez mais agressivo ao longo dos anos, principalmente quando ele ficava bêbado. O dia mais crítico foi quando ele machucou a minha cabeça e saiu sangue.  Meus filhos gritavam, para me ajudar, mas eles eram crianças, não podiam fazer muita coisa. Hoje estamos mais velhos e esses casos não acontecem mais, graças a Deus”. Jandira é empregada doméstica.

 

Margareth Ferreira 

Margareth Ferreira é secretária e moradora do Rio de Janeiro.  Após 20 anos casada com o marido, ela pediu separação. Com a não aceitação, ele a agrediu e a perseguiu durante um tempo, fazendo ameaças.

“Eu era casada com meu marido durante 20 anos e chegou um momento que a nossa relação começou a desgastar. Eu entrei com um processo de separação, mas ele não aceitou. Durante todo esse tempo, a minha vida virou um inferno. Ele me procurava no trabalho, me seguia e chegou a me agredir fisicamente algumas vezes. Acho importante relatar isso tudo porque um ciúme doentio pode se tornar uma obsessão e foi o que ocorreu. Hoje em dia eu ainda me sinto aprisionada nisso tudo, por mais que ele não possa nem chegar perto de mim. As marcas do passado ficam na gente, não tem jeito”

 

Eloá Cristina Pimentel 

O caso da jovem Eloá Cristina Pimentel em São Paulo é um dos casos emblemáticos e claros de violência contra a mulher devido ao ciúme doentio. Lindemberg Alves Fernandes, de 22 anos na época, ex namorado invadiu o apartamento dela e a sequestrou junto com 4 amigos. Após dias de sequestro e negociações com a polícia, Eloá foi morta por Lindemberg a tiros.  Condenado por 12 crimes, o agressor pegou 98 anos de prisão.

Luzimar Diogo Lannes

 

Luzimar mora em São Gonçalo com a filha Thayane. Ela conta que o ex marido dela tentou prender ela e a filha na casa onde moravam e tacou fogo no local.  Ela conta que procurou ajuda, e o marido tem que ficar de pelo menos 500 metros dela.

“ Eu tenho muito medo dele. Tenho verdadeiro pânico dela. Tenho medo dele se aproximar de mim e dos meus filhos, porque ele é muito ruim. Ele é capaz de fazer qualquer coisa. Depois que teve a lei Maria da Penha, eu perdi o pânico, eu tive mais coragem de denunciar, mas na verdade, para mim não adiantou muita coisa, porque eles estivessem me ajudado antes, quando eu fui pedi ajuda, acredito que nada disso teria acontecido. ”

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